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Gonorréia

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A gonorreia é uma infecção bacteriana transmitida através do contato sexual ou pela passagem do recém nascido pelo canal de parto. Infecta as mucosas do trato genito-urinário, podendo também acometer reto, boca e conjuntiva ocular.

É uma doença conhecida desde os tempos do Velho Testamento. O quadro clínico varia desde infecções assintomáticas a quadros de uretrite, salpingite, epididimite agudas e com sintomas exuberantes.

A gonorreia é um facilitador para infecção pelo HIV e o HIV, por sua vez, promove mudança da história natural da gonorreia, com o aparecimento de quadros mais graves.

As maiores taxas de incidência de gonorreia e de suas complicações ocorrem nos países em desenvolvimento.

 

QUAL AGENTE ETIOLÓGICO?

 

É uma bactéria chamada de Neisseria gonorrhoea ou simplesmente gonococo. É um diplococo Gram negativo que somente cresce em meio “in vitro” especial, o Thayer-Martin.

A infecção gonocócica apresenta alta contagiosidade, sendo o homem o reservatório natural do gonococo. O homem doente constitui a fonte de infecção, tendo esse o papel de grande veículo disseminador.

A infecção pela Neisseria gonorrhoea está fortemente associada a infecção pela Chlamydia trachomatis. Dentro do diagnóstico sindrômico, o tratamento da gonorreia sempre irá envolver o tratamento concomitante da clamidíase.

 

QUEM É MAIS ACOMETIDO PELA GONORREIA?

 

A faixa etária mais comprometida situa-se entre 15 e 30 anos, com o maior número de casos entre 20 e 24 anos. A maioria dos casos é encontrada em homens, provavelmente por maior facilidade diagnóstica, já que 70% das mulheres infectadas permanecem assintomáticas.

A gonorreia mostra-se mais freqüente em não brancos que em brancos, alcançando proporções de até 40:1. Fatores associadas com risco aumentado de gonorreia incluem baixo nível sócio-econômico, nível inferior de educação e residência urbana.

O risco de aquisição da gonorreia em um único intercurso na mulher gira em torno de 50%, em duas exposições de 87,5%, e em mais de duas exposições de 100%. No homem, em um único intercurso, aproxima-se de 80%.

 

COMO SE PREVINE A GONORREIA?

 

A gonorreia, como a maior parte das doenças sexualmente transmissíveis, é prevenida pelo uso de preservativos.  A identificação e tratamento precoce dos pacientes e parceiros sexuais rompem a cadeia de transmissão desta doença.

 

QUADRO CLÍNICO:

 

Após o contato e infecção pela bactéria, a doença se desenvolverá em 2 a 5 dias (período de incubação).

No homem, a uretrite aguda representa a manifestação predominante. Os principais sintomas incluem o corrimento uretral e a disúria, geralmente sem aumento da freqüência ou urgência urinária. O corrimento pode ser inicialmente mucoide, mas em 1 a 2 dias, torna-se purulento. A maioria dos casos de uretrite gonocócica não tratados evolui para cura espontânea em algumas semanas. Uma pequena proporção de homens permanece assintomática e não apresenta sinais de uretrite. A epididimite aguda constitui a complicação mais comum da uretrite gonocócica, sendo responsável por 10% das epididimites agudas nos jovens. Dependendo da extensão do processo inflamatório, poderão ocorrer complicações como edema peniano, balanopostite, cowperite, litrite, prostatite e orquite. Poderá também evoluir para quadros sistêmicos, caracterizando a gonococcemia em todas as suas manifestações, como a artrite gonocócica, a síndrome de Fitz-Hugh-Curtis e complicações cardíacas e nervosas.

Na mulher, locus primário da infecção genital situa-se na endocervice, porém gonococo é também freqüentemente recuperada da uretra, reto, glândulas periuretrais de Skene e ductos das glândulas de Bartholin. A evolução natural da gonococcia na mulher continua menos compreendida que no homem, parcialmente pela freqüência de co-infecções com outros patógenos, como Chlamydia trachomatis e Trichomonas vaginalis. A maior parte das pacientes infectadas provavelmente desenvolve sintomas, mas muitas permanecem assintomáticas ou desenvolvem sintomatologia leve que não gera preocupação e busca de assistência médica. Então, mulheres com infecção subclínica acumulam-se na população, e em grupos nos quais identifica-se a maioria das infecções por triagem ou por busca ativa, mais de 90% das mulheres permanecem assintomáticas. Os sintomas predominantes incluem a cervicite, às vezes uretrite, corrimento vaginal, disúria e sangramento intermenstrual. A dor abdominal ou pélvica geralmente se associa à salpingite. O exame físico pode ou não revelar exsudato cervical purulento ou mucopurulento e outros sinais de cervicite purulenta, como edema em zona de ectopia cervical ou sangramento endocervical. A dor presente à mobilização uterina e à palpação anexial geralmente associa-se a infecção ascendente. Alterações tubárias podem ocorrer como complicação da infecção pelo gonococo, levando aproximadamente a 10% dos casos de obstrução tubária e infertilidade. Nos casos em que não ocorre obstrução, há risco de gravidez ectópica.

Na infecção retal, mais de 40% das mulheres com gonorreia não complicada e uma proporção semelhante de homens homossexuais apresentam culturas retais positivas para N. gonorrhoeae. O reto constitui o único local infectado em 40% dos homossexuais masculinos e em 5% ou menos das mulheres com gonorreia. A maioria das pessoas com culturas retais positivas permanece assintomática, mas algumas apresentam proctite aguda, com dor, prurido, tenesmo, descarga purulenta e sangramento retal. A anuscopia revela em alguns casos exsudato mucopurulento e alterações inflamatórias na mucosa retal.

A faringite gonocócica é provocada pela exposição sexual orogenital. Esta pode ser encontrada em 10 a 20% das mulheres heterossexuais com gonorreia e em 10 a 25% dos homens homossexuais. Raramente há faringite aguda ou linfadenite cervical; a maioria das infecções faríngeas permanece assintomática.

A infecção ocular nos adultos geralmente resulta da autoinoculação da conjuntiva em uma pessoa com gonorreia genital. A conjuntivite é geralmente grave, com exsudato purulento, e ulceração corneana pode ocorrer rapidamente na ausência de antibioticoterapia imediata.

A perihepatite aguda (síndrome de Fitz-Hugh e Curtis) ocorre primariamente por extensão direta da Neisseria gonorrohoeae ou da Chlamydia trachomatis da trompa de Falópio à cápsula hepática e ao peritônio adjacente. A perihepatite resulta em dor abdominal, hipersensibilidade em topografia hepática, e sinais de peritonite em hipocôndrio direito. A maioria dos casos ocorre simultaneamente com doença inflamatória pélvica, mas muitas mulheres não relatam sintomatologia pélvica. A perihepatite deve ser considerada no diagnóstico diferencial de dor em quadrante superior direito do abdome em pacientes jovens sexualmente ativas.

A infecção gonocócica disseminada (IGD) resulta de bacteremia gonocócica e ocorre em 0,5 a 3% dos pacientes infectados. Artrite séptica é uma síndrome característica de poliartrite e dermatites constituem as manifestações predominantes. É a principal causa de artrite infecciosa em adultos jovens e acomete mais comumente joelho, cotovelo, tornozelo e punho.  As complicações raras incluem a endocardite, a meningite, a osteomielite, a sepse com síndrome de Waterhouse-Friderichsen e a síndrome da angústia respiratória do adulto.

 

QUAIS AS SEQUELAS DA GONORREIA?

 

As principais seqüelas são: infertilidade, dor pélvica, aderências pélvicas, abscessos pélvicos, obstrução tubárea, dilatação de trompas (hidrossalpinge), bartholinite, alteração de motilidade do esperma, etc.

 

GONORREIA E GRAVIDEZ

 

A infecção endocervical pela gonorreia na gravidez pode ocasionar a ruptura prematura de membranas e trabalho de parto pré-termo. A gravidez impede o desenvolvimento da doença inflamatória pélvica e perihepatite.

Mães infectadas podem transmitir o gonococo para o recém nascido durante a passagem pelo canal de parto, ou no período pós-parto. A conjuntivite gonocócica do neonato (oftalmia neonatorum) representa a manifestação mais comumente reconhecida e ainda é importante causa de cegueira nos países em desenvolvimento. A profilaxia é feita pela instilação de uma solução aquosa de nitrato de prata a 1% no pós-parto. Recém-nascidos expostos à gonorreia também podem desenvolver doença sistêmica, com sepse e artrite. Entretanto, vaginite purulenta constitui a principal manifestação da gonorreia em crianças pré-púberes após o período neonatal. No período neonatal até 1 ano de idade, as crianças adquirem a doença por via não-sexual de um parente infectado, usualmente na vigência de maus hábitos de higiene. Após um ano de idade, as crianças adquirem a gonorreia por abuso sexual.

 

DIAGNÓSTICO:

 

Sempre que possível a cultura da secreção uretral, da mucosa genital, hemocultura, do fluido sinovial, da orofaringe e do reto deve ser realizada. Como é uma cultura realizada em meio especial, este exame não é realizado de rotina na prática clinica. O diagnóstico é feito através da história clínica e dos achados ao exame físico, isto é, é realizado um diagnóstico de presunção. Quando a cultura não é disponível, o PCR para gonococo pode ser utilizado.

 

TRATAMENTO:

 

O tratamento com a penicilina foi abandonado devido a taxas de resistência tão altos como 30%.

Recomenda-se como terapia inicial um dos quatro esquemas terapêuticos abaixo, em dose única:

  • ceftriaxona 250mg IM,

  • cefixime 400mg VO,

  • ciprofloxacina 500mg VO

  • ofloxacina 400mg VO.

Independente do antibiótico de única dose escolhido, o tratamento deve ser seguido de uma terapia ativa contra Chlamydia trachomatis. Os esquemas recomendados são:

  • doxiciclina 100mg 12/12h VO diariamente por 7 a 14 dias,

  • azitromicina 1g VO, dose única.

As grávidas, crianças e pacientes com infecção disseminada deverão ser tratadas com ceftriaxona.

Para ser considerada corretamente tratada, os parceiros sexuais deverão ser examinados e tratados com o mesmo esquema descrito acima.

Dentro do contexto de saúde pública, o tratamento da gonorreia deve ser vista dentro do contexto de abordagem sindrômica das doenças sexualmente transmissíveis. A abordagem sindrômica agrupa a maioria das DSTs nas categorias: úlcera genital, corrimento uretral no homem, corrimento cervical e dor pélvica.

 

Autor

Dr Heitor Leandro Paiva Rodrigues

Dr Heitor Leandro Paiva Rodrigues

Ginecologista e Obstetra

Especialização em Titulo de Especialista em Ginecologia E Obstetrícia no(a) FEBRASGO.